quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Lara

texto por Ariadne Catarine



A Lara andava de um lado para o outro, estava aflita com seus pouco mais de 9 anos. Ela passava a mão pelo cabelo, pelo rosto, pelo corpo. Parecia querer se limpar. Foi em uma das minhas viagens que conheci a Lara. No auge de suas descobertas, Lara é extremamente questionadora, tudo vira motivo para uma série de perguntas. Mas naquele dia ela não conseguiu questionar, debater, falar. Ela estava cansada. Ficou inquieta. Fui me aproximando bem devagar, enquanto ela me olhava de canto de olho. Quando consegui chegar perto, questionei se estava tudo bem.

Lara tentou balançar a cabeça dizendo que sim, mas seus olhos negaram e a boca se abriu em pranto. Em meio às lágrimas, Lara me perguntou: “Eu sou tão feia assim?”. Olhei em seus olhos e disse: “Você é linda, Lara!”. Ela tremia. Abraçamos. - “Tava todo mundo rindo, todo mundo dizia que sou feia, preta e fedida. Tavam rindo do meu cabelo”. Dentro de mim, eu só queria encontrar um jeito fácil de empoderar aquela pequena mulher. E queria chorar. Repeti muitas vezes o quanto ela é linda- “Linda, linda, linda”. Ela me encarava lutando para acreditar naquelas palavras. Quando as lágrimas diminuíram conseguimos conversar. Lara argumentava: “Eu tenho hidratante de baunilha, meu cabelo também é cheiroso. Por que eu tenho que ser a feia, preta e fedida? Por que eles não me deixam em paz?”. 




Falamos sobre as mulheres negras que admiramos. Falamos sobre cabelo. Brincamos com algumas bonecas negras. Discutimos diversos preconceitos. Lara explicou que já conhece a palavra racismo, aprendeu quando tinha 5 anos, um menino da escola a apelidou de “macaca”, a professora durante uma aula explicou que aquilo era racismo, o menino continuou ofendendo a Lara durante o intervalo.



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Depois da conversa Lara parecia mais calma. Mas me pergunto o conflito ficou amenizado até que ponto? Lara ainda vai continuar chorando escondida no banheiro como acontece com muitas meninas negras? Como podemos empoderamos nossas crianças? Como acolhemos as dores de tantas Laras?

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